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Economia fraterna para um mundo mais justo


Escola Waldorf Guayí extingue mensalidades e adota sistema de contribuição social, modelo já tem inspirado outras instituições.

Imagine uma escola cuja renda não seja fator determinante para o ingresso de um filho, mas sim o respeito à pedagogia e a disposição em, numa sincera análise financeira, definir dentro do orçamento a quantia possível para a instituição acolher a criança e, de repente, mais alunos?

Essa escola existe. Localizada em Embu das Artes/SP, a Escola Waldorf Guayí iniciou neste ano de 2021 a prática da economia fraterna com o Projeto Aprumar, que tem dado certo e, inclusive, inspirado outros colégios.

Responsável pela implementação do modelo de fraternidade econômica da Guayí, Jefferson Reis, presidente da Associação Mantenedora, explica que a Fraternidade econômica é um dos pilares da Trimembração Social, idealizada pelo criador da pedagogia Waldorf, Rudolf Steiner, no início do século XX na Alemanha. “Steiner elaborou uma proposta para lidar com a questão social que é baseada nos ideais da Revolução

Francesa de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, harmonizando esses três âmbitos. Para isso, devemos buscar liberdade no campo cultural e religioso, igualdade no político-jurídico e a fraternidade na área econômica”, explica Reis.

De acordo com o presidente da Associação, não há como ser livre se um pensamento for imposto como verdade única. Aí se insere a liberdade no quesito cultural; quando se fala em igualdade no campo político-jurídico, todas as leis e regras deveriam valer de forma igual para todos, sem privilégios. Já no campo econômico entra a fraternidade, onde cada pessoa apresenta um contexto diferente, considerando possibilidades de acesso, de geração de renda, e aí cada um vai ter uma necessidade diversa também. Portanto, para o desenvolvimento de uma sociedade saudável é preciso buscar harmonizar esses três aspectos, um potencializando o outro.


No entanto, a pedagogia Waldorf, que vem ganhando espaço em todo o mundo, geralmente fica restrita a um pequeno grupo social, por conta das altas mensalidades. Incomodado com essa dissonância, Reis procurou por em prática algo que já estava sendo gestado. “Ao acessar os números, vi que a escola dizia que tinha quatro mensalidades, mas na verdade atendia 29 faixas, ou seja, 29 realidades financeiras diversas. Então já havia uma adequação às diferentes realidades das famílias, um olhar humanizado. Estudando esses números, vimos que, se fizéssemos a aplicação das quatro mensalidades, dos 74 alunos que tínhamos, íamos ter que dispensar 44, pois esses não conseguiriam pagar os valores propostos”, detalha Reis, e acrescenta: “Além de perder os 44 alunos, também se esvairia 60% da arrecadação e ainda algo que não se mensura: a diversidade no ambiente escolar”.

Diante dessa realidade, a Guayí num esforço e ampliação de consciência contínuos partiu para um sistema mais saudável e abrangente: excluiu a mensalidade e adotou o sistema de contribuição social. “Todo esse processo teve as belezas e dores de um parto natural. O medo principal era da escola quebrar. Para evitar isso foram desenhados números de alunos por cada faixa de contribuição. Resultado: 86% das pessoas que eram mensalistas mantiveram ou aumentaram sua contribuição. Aqui há um ponto interessante de que às vezes os pais pagam determinado valor porque acham que já cumpriram seu papel, mas nesse modelo viram que poderiam pagar mais e colaborar com outros. Catorze por cento pediram redução pelo impacto financeiro da pandemia em seus negócios, então independentemente da modalidade financeira, iriam solicitar essa revisão, mas aí os 86% cobriram a lacuna que ficou e no final tivemos um superávit”.

Impactada pelo projeto, Danielle Morgado Melantonio, mãe de um aluno no primeiro ano, lembra-se do desconforto que já passou em algumas instituições para adquirir um desconto, onde teve que expor toda a sua vida financeira. “O Aprumar é algo muito humano, parece que estamos voltando a uma época em que a palavra vale muito. Eu poder dizer o que eu posso pagar e eles confiarem em mim é algo de brilhar os olhos, de se emocionar, pois não precisei ficar expondo a mim nem à minha família. Por meio do Aprumar, a maneira como ingressamos na escola já é um aprendizado e isso faz eu desejar cada vez mais estar lá, me dedicar, é um sentimento verdadeiro”, relata.

Pai de três alunos da Guayí, Djair Guilherme da Silva Junior, lembra que o projeto era um sonho de tempos. “O oferecimento de bolsas, por melhor que seja a intenção, acaba inferiorizando a família, parece que aquilo não é para você, que alguém está te fazendo um favor e isso impacta diretamente na dignidade. O diferencial do Aprumar é justamente pensar na dignidade da família e que a contribuição pode ser mais do que meramente a questão financeira. Para nós é um sonho realizado, queremos alcançar mais pessoas”.

O presidente da Associação lembra que num sistema tradicional de mensalidade a equipe adota premissas de quantos alunos terão no ano seguinte, além dos custos, mas na verdade não se sabe se esse número vai acontecer. Então, se determina uma coisa que vai cercear várias pessoas. “E aí um pai que paga um valor estipulado facilmente de repente poderia pagar três vezes mais, enquanto o outro que solicitou a bolsa e paga metade da mensalidade empenha ali 70% de seu orçamento, e o outro pagando três apenas 2%, então qual tem mais valor para a escola? Os dois são igualmente importantes, o valor trazido por cada família é sagrado”, ressalta. “A partir da implementação do Aprumar, os resultados têm sido muito positivos, conseguimos por meio da fraternidade o ingresso de 37 novos alunos, aumento de 18% da receita e estamos proporcionando vivências diversas no ambiente escolar, o que é muito positivo para todos. O que antes era somente ideia agora é realidade, nasceu!”, comemora, destacando que a palavra Guayí em tupi-guarani significa semente boa.

Reis ainda frisa que a economia fraterna tem sido aplicada em várias frentes na Guayí, com resultados relevantes: “Tivemos ações muito interessantes a partir da venda de livros doados por uma professora, e da feijoada feita por uma família simpatizante da escola, que doou o caldeirão, e a arrecadação sempre nos surpreende, mostrando que a fraternidade está operando e prosperando na nossa comunidade. Quando esse movimento acontece, acessa a verdade de cada um. Qual é a causa? Quanto que eu acho justo investir? A partir dessa conscientização, mostramos às famílias que estão e vão chegando de que não é meramente a contratação de um serviço, mas estimulamos a abertura do olhar para o real valor das coisas, trazendo essa transparência e essa consciência para ampliar a visão em prol do coletivo”.

Rafaela Mercês

MTB 43817

(13) 99119-5353



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